In this paper, we propose an analysis of a Sentence produced inside a lawsuit filed by prosecutors against a woman accused of committing the crime of self-induced abortion. For the analysis proposed, we based on Olbretchs-Tyteca and Perelman (1996) and their argumentative categories developed in the New Rhetoric, and Amossy (2006), who studies argumentative discourse. We aimed to understand the object of research in its argumentative structure, trying to identify and correlate aspects of the institutional framework that shapes the practice of argumentation in this utterance, the input channels of doxa elements, manifestations of discursive heterogeneity, the presence of social representations, the construction and circulation of images in the discourse and processes of stereotyping. We concluded that gender Sentence is subject to a framework of strong generic constraints and institutional modeling and determines speaking conditions. We still concluded that Sentence is a genre composed by voices from the legal field (the standard speech, science of law speech and discourses produced in other courts), and doxa elements circulating in the social environment. Therefore, there is not neutrality of judging instances because members of the judiciary are also subject to the shared beliefs, to received ideas, stereotypes circulating, like any other subject living in a society at a certain historical moment.
Neste artigo, propomos a elaboração de uma análise linguístico-discursiva de um acórdão, produzido no interior de um processo criminal instaurado para apurar suposta prática de aborto voluntário por uma mulher. Para isso, apoiamo-nos principalmente nos constructos teóricos de Amossy (2006), de estudo da argumentação no discurso, em paralelo com a Teoria da Argumentação de Perelman e Olbrechts-Tyteca (1996), conhecida como Nova Retórica. Ao empreendermos essa análise, objetivamos a compreensão do objeto de pesquisa em sua estrutura argumentativa, buscando identificar e correlacionar aspectos como o quadro institucional que modela o exercício da argumentação nesse proferimento, os canais de entrada dos elementos dóxicos, as manifestações de heterogeneidade mostrada, a presença das representações sociais, a construção e a circulação de imagens de si e do outro no discurso e os processos de estereotipia. Concluímos que o gênero acórdão está sujeito a um quadro de fortes restrições genéricas e institucionais, que modela e determina as condições do dizer. Concluímos, ainda, que se trata de um gênero formado a partir de vozes provenientes do próprio campo jurídico (discurso da norma, discurso da ciência do Direito e discursos produzidos em outros tribunais), e de elementos dóxicos circulantes no meio social. Portanto, por mais que se postule uma pretensa neutralidade das instâncias julgadoras diante dos casos que lhes são submetidos, esse é um ideal inatingível, pois os membros do judiciário também estão sujeitos às crenças compartilhadas, às ideias recebidas, aos estereótipos circulantes, como qualquer outro sujeito que viva em dada sociedade, em certo momento histórico.